Fluvia Lacerda para a revista Época


ÉPOCA – Você é hoje considerada a principal modelo Plus Size do mundo. Como começou
Fluvia Lacerda – Eu estava no ônibus, indo para casa, em Nova York, e uma produtora de moda de uma revista se aproximou e perguntou se eu já tinha considerado a ideia de fotografar. Meu choque inicial foi porque não sabia que existia um mercado como esse. Não tinha experiência, não sabia como era. Fiquei assustada, nunca imaginei que pudesse ser modelo. Mas isso foi logo de início, depois foi tudo tranquilo. Nunca tive problema com a minha aparência.

ÉPOCA – As pessoas acham que, para ser modelo, basta ser magra. No mercado Plus Size, qualquer gordinha pode ser modelo, então? 
Fluvia – Não. Existem algumas exigências. São as mesmas exigências de uma modelo magra, de altura, proporção, de você estar com tudo durinho. Não é só porque você é gordinha que pode ser modelo. Tem que ter fotogenia. Muita mulher é bonita, mas não fotografa bem. O contrário também acontece, uma mulher que, na rua, você não diria que é bonita, fotografa super bem.

ÉPOCA – Precisa malhar? 
Fluvia – Com certeza. Faço Yoga, Pilates, meu meio de transporte em Nova York é a bicicleta. Sempre fui muito ativa, não consigo ficar parada sem fazer nada.

ÉPOCA – Você é considerada a Gisele Bündchen do Plus Size, como vê isso? 
Fluvia – Eu me sinto muito lisonjeada. Acho que isso vem muito do fato de a mulher brasileira ser sexy por natureza. A Gisele trouxe isso. Como sou a única brasileira trabalhando com o Plus Size aqui fora, é natural a comparação.

ÉPOCA – Aqui no Brasil, ainda não dá para viver disso, dizem as poucas modelos do segmento. Aí, é possível? 
Fluvia – Sim, eu vivo do que eu faço. Três meses depois que eu assinei meu primeiro contrato, não parei mais. No Brasil, ainda é complicado, não existem muitas marcas para esse mercado.

ÉPOCA – A Gisele faturou, no ano passado, US$ 45 milhões. Uma modelo Plus Size chega a isso aí em Nova York? 
Fluvia – Não posso falar pelas outras. Mas ganho muito bem, comprei meu apartamento e vivo bem.

ÉPOCA – Vocês chegam à marca do milhão? 
Fluvia – Perto...

ÉPOCA – As grifes mais tradicionais aceitam as modelos Plus Size? 
Fluvia – O mercado aqui fora está estabelecido há algum tempo. Na Europa e aqui nos EUA, as revistas, as marcas já aceitam algo que é inevitável. É uma exigência do povo, da população feminina no mundo inteiro. As mulheres estão cansadas de idéias que não correspondem ao dia a dia. As mulheres querem se ver refletidas, querem se sentir bonitas e ver uma pessoa que reflete o biotipo delas. Por isso, acho que o mercado expandiu muito. Marc Jacobs, por exemplo, já cria roupas Plus Size. O tamanho 30, 32, até o 29, tamanho de uma criança, não corresponde à realidade das mulheres, ninguém entra numa calça 29!

ÉPOCA – Ainda assim, existe preconceito dessas marcas maiores? 
Fluvia – Acho que sempre vai existir, porque tudo um reflexo de como as pessoas que dirigem essas marcas pensam. Muita gente tem repugnância e pânico de engordar e isso se reflete no trabalho delas da forma mais negativa possível, no sentido de eles não aceitarem que essa não é a realidade da população. Esse tipo de barreira aqui fora já não existe tanto, porque as marcas já perceberam que é preciso mudar. Não quer dizer que todos gostem. Mas isso é um negócio e todo mundo precisa de dinheiro.

ÉPOCA – O que você acha que essa sua premiação representa para as gordinhas? 
Fluvia – O que representa eu não sei, mas eu espero é que dê bastante orgulho a elas e que realmente traga a mensagem que o tamanho da sua calça jeans, o seu manequim, não definem quem você é como pessoa. É importante você ser feliz como pessoa. Sua aparência física não pode te impedir de nada. Eu jamais imaginei que minha vida tomasse o rumo que acabou tomando. Se eu fosse determinar minha vida pelo fato de ser gordinha, se eu tivesse me limitado, achasse que não pudesse ser feliz, que não pudesse ter um relacionamento, porque sou gordinha, não teria feito nada.

ÉPOCA – A São Paulo Fashion Week está acontecendo essa semana aqui no Brasil. Você já desfilou na semana de São Paulo? 
Fluvia – Nunca tive a oportunidade, mas gostaria muito.

ÉPOCA – O pessoal não convida? 
Fluvia – Olha, na verdade, esse mercado só surgiu no Brasil depois que eu voltei e comecei a reclamar. Eu já tinha carreira lá fora e quando vim, vi que não existiam lugares onde comprar uma roupa bonita, como aqui fora. Desde 2007 quando fui ao Brasil, o mercado começou a expandir, mas ainda está na infância. Faltam marcas pra gente modelar. O Brasil é muito preconceituoso em relação a muitas coisas. Em relação às gordinhas, principalmente. Tenho um número grande de histórias de norte a sul do país, que recebo por e-mail. A começar pela numeração, que nunca é uniforme. Duas lojas, num mesmo shopping, têm uma mesma numeração em tamanhos completamente diferentes. Não há uma padronização exigida pelo governo. Começa por aí o problema. Acho uma falta de visão de negócio.

ÉPOCA – Fluvia, estamos falando aqui de tamanhos, quanto você tem de altura e peso? 
Fluvia – 1,72 metro, mas não me peso. Pra mim, peso é um número. Tenho um acordo com meu médico de que, se meu exame anual de sangue sair perfeito, sem problemas, não me peso. Meu médico sempre diz que sou uma das pacientes mais saudáveis que ele tem.

Fluvia é a única modelo plus size brasileira a trabalhar internacionalmente e foi escolhida como modelo do ano na Semana de Moda Plus Size de Nova Iorque. A fundadora da semana de moda, Gwendolyn DeVoe, anunciou que Fluvia foi escolhida por todos os esforços em promover o segmento no mundo. A terceira edição do evento foi no Metropolitan, em NY. Já a premiação ocorreu no dia 18.